27/06/14

Debate sobre a Comunicação Social em Angola


 Declaração do grupo parlamentar


 

Senhor Presidente da Assembleia Nacional,
Senhores Deputados,
Senhores Representantes do Titular do Poder Executivo

Lindo Bernardo Tito (centro) apresentou a comunicação pelo GP (arquivo)
1.    Permitam-me que exprima, em nome do Grupo Parlamentar da CASA-CE, os votos de saudação e reconhecimento a todos os jornalistas dos distintos órgãos de comunicação social, que em situações adversas à deontologia e ética profissionais, exercem a sua profissão, bem como desejar, que se mantenham fiéis à nobre missão de informar com verdade e formar nos cidadãos uma consciência crítica e democrática.

2.      O Estado Angolano desde 1991 é,  formalmente, um Estado Democrático  de Direito, onde os direitos políticos e civis, universalmente plasmados nos instrumentos jurídicos internacionais, passaram a fazer parte da ordem político-jurídica interna.  Aos  cidadãos foram atribuídos, entre a imensidão de privilégios políticos e jurídicos, a liberdade de expressão,  de informação e a liberdade de imprensa, consagradas hoje nos artigos 40º e 44º da Constituição.



3.    Mas é a liberdade de imprensa que queremos destacar aqui. Liberdade na diversidade, reflectida na comunicação social com conteúdo programático e noticioso plural, e a titularidade dos órgãos de comunicação social não monopolizados.

4.    A diversidade na comunicação social  reforça e amplia o exercício dos direitos democráticos. Ou seja, a diversificação das fontes de informação fomenta a disputa do espaço informativo, estimula o debate contraditório na sociedade, premeia processos políticos equilibrados e viabiliza processos socializantes que internalizam a cultura e normas sociais em cada cidadão.

           Senhor Presidente,

5.    O grupo dominante que controla o poder político há 39 anos,  apesar de ter  admitido a mudança do sistema monolítico  para a democracia pluralista, não foi capaz de  interiorizar e apreender, em consciência, os fundamentos de um novo Estado. Esta falta de convicção democrática tem expressão  no discurso de Sua Excelência o senhor Presidente da República, proferido, em 2005, na cidade do Namibe, quando dizia que a democracia nos foi imposta e que os direitos humanos não enchem a barriga a ninguém. Esta afirmação é prova mais do que evidente, que o grupo dominante manifesta imensas dificuldades em coabitar com os valores democráticos. Ou seja, houve apenas uma simples metamorfose do agente monolítico, mas não a modificação da sua natureza.

6.     Assiste-se em Angola, à aplicação da estratégia política que instituiu uma comunicação social de marketing  político, em detrimento da comunicação social, ao serviço do interesse geral. A aplicação desta estratégia resume-se nas seguintes acções: 

-       A primeira, fundada no controlo dos medias públicos, transformando-os em  meros instrumentos a favor do grupo dominante;
-        A segunda, monopolização dos órgãos independentes de comunicação social, através da criação de entes supostamente de natureza privada, mas usando os recursos financeiros de todos os angolanos;
-        A terceira, a criação de órgãos estatais de controlo, à margem do Ministério da Comunicação Social.

7.    A comunicação social de marketing politico, institucionalizada, tem como objectivo central, a conservação, cega e impiedosa do poder politico, aplicando para o efeito métodos próprios das ditaduras, onde pontifica o exercício unipessoal do poder politico, o desrespeito à Constituição, e à Lei e a repressão policial contra os jornalistas.

            Excelências,

8.    Enquanto um dos indicadores importante da democracia numa sociedade, a comunicação social, em Angola, está partidarizada e refém da vontade do Partido no Poder, que instituiu, na prática um silencioso autoritarismo, concretizado através dos seguintes factos:

a)    A criação de Gabinetes, junto do Titular do Poder Executivo, que passaram a deter o controlo real da comunicação social do Estado, agindo paralelamente ao Ministério de Comunicação Social, como é o caso do GRECIMA ( Gabinete de Revitalização da Comunicação Institucional);

b)    Ausência do contraditório, nos órgãos públicos de comunicação social,  que favorece a intoxicação política dos cidadãos e a sua desinformação, bem como os ataque contra os adversários políticos;

c)    A falta de actualização do quadro jurídico legal da comunicação social, expressa pela não aprovação do pacote legislativo, ampla e publicamente discutido pelos profissionais da classe, sociedade civil e políticos, cujo  paradeiro é desconhecido;

d)    A inviabilização da aplicação concreta da lei nº 7/06, de 15 de Maio, lei de imprensa, condicionada pela sua não regulamentação, há mais de oito anos, constitui  uma manobra política, que visa perpetuar a inobservância dos princípios consagrados nos artigos 7º, 11º 17º , da referida lei, mormente da independência, isenção e objectividade, da comunicação social;

e)    A sistemática violação, consciente, da Lei nº 7/06, com maior destaque para os artigos 24º, 25º e 26º, que limita a participação de capital estrangeiro, na propriedade das empresas dos órgãos de comunicação social, proíbe a sua monopolização, e exige a nominação dos proprietários desses órgãos;

f)   O Conselho Nacional de Comunicação Social que devia exercer o papel  regulador da actividade dos órgãos de comunicação social, assegurando a objectividade e a isenção  de informação e a salvaguarda da liberdade de expressão, foi estrategicamente desvirtuado e neutralizado;

g) O assassinato de jornalistas, em circunstâncias até hoje não esclarecidas, como são os casos de Ricardo de Melo ( jornalista e proprietário do Imparcial Fax) e de Graves Chakussanga ( jornalista da Rádio Despertar), entre outros;

h) A Instituição do estado policial na  Comunicação Social Estatal (gerida com os recursos financeiros de todos os angolanos), controla e oprime a consciência dos jornalistas, afastando compulsivamente os que se opõem;

i)  Os órgãos de Comunicação Social do Estado não  transmitem os factos de interesse social, como por exemplo a repressão policial exercida  contra   os professores do Lubango, na Província da Huíla,  e do Cazengo, na Província do Kwanza-Norte, que pretendiam simplesmente exercer o seu direito à manifestação, constitucionalmente consagrado.

9.    Num quadro assim descrito, faz sentido, que Angola, infelizmente, seja colocada nos piores lugares da classificação mundial da Reporters San Frontiers, cotada na posição 128, quanto a liberdade de imprensa, e a qualificação de país não democrático.

Excelências,

10. O Estado Democrático de Direito,  em Angola, é apenas formal.
Para que as liberdades, de expressão, de informação e de imprensa, possam ser plenamente exercidas, não bastará a existência de boas leis, mas sim, fundamentalmente, a mudança de mentalidade do agente político. Ou seja, será imprescindível,  aos agentes políticos, encararem a lei como fundamento e limite da sua acção e não como mero instrumento para a realização da vontade e interesses particulares.
                
MUITO OBRIGADO

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