Marcolino Moco*:
Abandono de Lopo do Nascimento convida jovens a pensar saída pacífica para “situação
insustentável”
Jan 26, 2014
A intervenção
de Lopo do Nascimento, despedindo-se formalmente de uma, há muito anunciada saída
da vida política, que como era de esperar, teve partes escamoteadas na comunicação
oficial de Angola, seja qual for a face da realidade em que for apreciada, é um
marco histórico, no processo político angolano no sentido positivo.
Eu que como
amigo pessoal já o censurei pelo seu recuo de uma missão histórica de
transformar, dentro do MPLA, as ideias do “novo pan-africanismo” que sustentou
no discurso final, numa realidade, senti-me aliviado, no ponto em que as coisas
chegaram, e que tenho documentado com propostas concretas “para sairmos disso”,
por considerar que o Homem deixou uma mensagem de relevo para a juventude.
Não importam
as razões concretas que o terão levado a sair agora, os jovens (por vezes penso
que os mais velhos já estão demasiado contaminados por “tribalismos” e “racismos”
sempre disfarçados na verborreia do politicamente correcto) dentro do MPLA, na
oposição e na sociedade civil, deviam aproveitar este mote para começar a
discutir uma saída pacífica duma situação que e já se vai tornando insustentável.
Lopo do
Nascimento, Pepetela, eu próprio e tantos outros que das gerações mais velhas,
(“comprometidos” com um passado de actores do sistema de partido-único que
terminou em 1992, agora reciclado no “eduardismo” do pós 2002) temos esgrimido
um discurso sobre os problemas actuais, seremos sempre apodados junto dos mais
jovens, pelos mais renitentes dos nossos coetâneos, de “não termos o direito à
palavra” sobre o desejo de mudanças na actualidade. Por vezes penso que é isso
que cansa Lopo de Nascimento, Pepetela e outros mais velhos que gostariam também
de falar sobre o “escandaloso” do presente e são abafados pela força da desgraça
dos nossos próprios recursos naturais, que tudo compram, dentro e fora do país.
Lopo do
Nascimento, líder da ala do MPLA (de que era o prestigiado Secretário Geral)
que foi cobardemente afastado da direcção, no Congresso de Dezembro de 1998,
foi sempre a figura tutelar da criação de um novo MPLA, adaptado aos tempos
posteriores à queda do Muro de Berlim.
Deve-se
dizer agora, com toda a clareza, que foi a partir dessa altura que se construiu
o “MPLA” que temos hoje, que após o que chamam “derrota militar da UNITA”,
constrói sofregamente um Estado-Etnia política, que entrega todo o poder ao seu
líder, para da sua mesa recolher “as migalhas suculentas”. Todo o interesse
perdido em contribuir para a construção de Estado-Nação que respeite as diferenças
e a diversidade, sem comprar consciências.
Notei com
muito apreço as três figuras simbólicas que Lopo homenageou no seu discurso de despedida:
Lúcio Lara, Mendes de Carvalho e Nfulupinga Lando Victor. É esta Angola que
teremos de construir: a Angola pacífica mas contraditória, de todas as raças,
de todas as etnias e de todas as regiões, cada um com o seu sotaque, algumas “manias”
e diferentes cosmovisões.
Se Lopo, ao
longo da sua extraordinária vida política, não conseguiu encher o copo (quem
sozinho o conseguiria?), deitou uma gota de volume significativo num copo
chamado futuro pacífico de Angola.
Fonte: LusoMonitor
*Ex-primeiro-ministro
de Angola e ex-secretário executivo da Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa
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