Lisboa - O jornalista e activista angolano Rafael
Marques disse à Lusa que Portugal nunca quis saber do bem-estar dos angolanos e
que as próximas eleições gerais servem os “interesses” de Lisboa.
Fonte: Alto Hama
Algo vai mal no protectorado do regime angolano no sul
da Europa. Como é que o ministro Miguel Relvas e o presidente da Lusa, Afonso
Camões, permitem que a Lusa dê espaço a estas denúncias? O MPLA e o dono de
Angola, José Eduardo dos Santos, não gostam que cuspam no prato em que dá
comida aos sipaios portugueses.
É verdade, como bem sabem Relvas e Camões, que são
poucos os órgão de comunicação social portugueses que divulgarão esta conversa
com o Rafael Marques. Mesmo assim, do ponto de vista dos súbditos de sua
majestade Eduardo dos Santos, é um risco.
“Estas eleições servem os interesses económicos dos
portugueses porque esses interesses estão alicerçados na corrupção. Se o
Presidente da República de Angola sai do poder, haverá em Portugal uma série de
processos contra empresas portuguesas que têm feito negócios ilícitos em
Angola”, diz Rafael Marques.
“No meio disto tudo Portugal é um vendedor de
serviços. É um país que está em situação de crise e procura vender os seus
serviços a todos aqueles que têm o controlo dos fundos”, considerou o
jornalista e activista angolano.
Rafael Marques é responsável pelo portal “Maka
Angola”, que denuncia casos de abusos de direitos humanos e alegados casos de
corrupção e suborno, que correm na justiça angolana.
“Os investimentos que têm sido feitos em Portugal,
sobretudo pela família presidencial, o Manuel Vicente, o general Kopelipa
[figuras de topo do regime e próximas do Presidente José Eduardo dos Santos]
claramente configuram actos de branqueamento de capitais porque não podem e não
têm como explicar os biliões de dólares que ali são investidos”, afirma Rafael
Marques, acrescentando que Lisboa nunca quis saber do bem-estar do povo
angolano.
“Portugal nunca foi um aliado do bem-estar dos
angolanos. Nunca. Portugal colonizou Angola e, durante a guerra [civil],
Portugal também tudo fez para prosperar, havendo sectores que apoiavam a UNITA
e outros sectores que apoiavam o MPLA e vendiam armas, mesmo durante as sanções
das Nações Unidas”, acusou Rafael Marques.
“Portugal nunca teve um papel de respeito na defesa do
bem-estar e dignidade dos angolanos. Não se pode esperar que Portugal tenha
hoje este papel. Eventualmente, terá de passar uma ou duas gerações até que
surja em Portugal uma nova forma de fazer política e que olhe para Angola como
uma terra de futuro e que possa desbravar novas relações, mas desta geração não
se pode esperar absolutamente nada que seja benéfico para o povo angolano”,
afirmou.
“Se a vontade do povo for a mudança, não haverá
interesses internacionais que o impedirão, da mesma forma que se a maioria da
população genuinamente decidir que este sistema endémico de corrupção é o
melhor, porque permite a cada um ganhar a lotaria e ser extremamente rico da
noite para o dia, então também assim será”, concluiu.
Angola realiza no dia 31 eleições gerais, que vão
definir a composição do futuro Parlamento e determinar os futuros Presidente e
vice-Presidente da República, por via fictícia, a partir do número um e número
dois da lista do partido mais votado.
De facto, como há já muitos anos diz o Rafael
Marques, os portugueses (entre muitos outros, entre quase todos) só estão
mal informados em relação a Angola porque querem, ou porque têm interesses
eventualmente legítimos mas pouco ortodoxos e muito menos humanitários.
Custa a crer, mas é verdade que os políticos, os
empresários e os (supostos) jornalistas portugueses (há, é claro, excepções)
fazem um esforço tremendo (se calhar bem remunerado) para procurar legitimar o
que se passa de mais errado com as autoridades angolanas, as tais que estão no
poder desde 1975.
Alguém, pergunto eu, ouviu Cavaco Silva recordar que
68% da população angolana é afectada pela pobreza, que a taxa de mortalidade
infantil é a terceira mais alta do mundo, com 250 mortes por cada 1.000
crianças?
Alguém ouviu Passos Coelho recordar que apenas 38% da
população angolana tem acesso a água potável e somente 44% dispõe de saneamento
básico?
Alguém ouviu José Sócrates recordar que apenas um
quarto da população angolana tem acesso a serviços de saúde, que, na maior
parte dos casos, são de fraca qualidade?
Alguém ouviu Pinto Balsemão recordar que 12% dos
hospitais, 11% dos centros de saúde e 85% dos postos de saúde existentes no
país apresentam problemas ao nível das instalações, da falta de pessoal e de
carência de medicamentos?
Alguém ouviu Belmiro de Azevedo recordar que a taxa de
analfabetos é bastante elevada, especialmente entre as mulheres, uma situação é
agravada pelo grande número de crianças e jovens que todos os anos ficam fora
do sistema de ensino?
Alguém ouviu António Pires de Lima (Presidente da
Comissão Executiva da UNICER e dirigente do CDS/PP) dizer que 45% das crianças
angolanas sofrerem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%)
morre antes de atingir os cinco anos?
Alguém ouviu Jorge Coelho (Mota-Engil) dizer que, em
Angola, a dependência sócio-económica a favores, privilégios e bens, ou seja, o
cabritismo, é o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos?
Alguém ouviu Armando Vara (presidente da Camargo
Corrêa para África) dizer que 80% do Produto Interno Bruto angolano é produzido
por estrangeiros; que mais de 90% da riqueza nacional privada é subtraída do
erário público e está concentrada em menos de 0,5% de uma população; que 70%
das exportações angolanas de petróleo tem origem na sua colónia de Cabinda?
Alguém alguma vez ouviu algum dirigente dos três
actuais maiores partidos portugueses dizer que, em Angola, o acesso à boa
educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras,
aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos, está limitado a um
grupo muito restrito de famílias ligadas ao regime no poder?
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